sexta-feira, 2 de abril de 2010

Lógica de Resultados

Gostaria de comentar aqui duas afirmações que encontrei no artigo “Se oriente, rapaz”, de Marcos Vono, publicado no domingo 28, no Estadão. Tentarei refletir sobre elas relacionando-as a prática profissional docente. Bom, eis as afirmações:

“Competir no mercado de trabalho não é diferente de nenhuma outra disputa. O que torna alguém vencedor são seus resultados, não o seu potencial. Atingir resultados profissionais, porém, requer formação e persistência.”

“O grande desafio no início da carreira é aplicar consistentemente os conceitos assimilados no período de formação. É transformar conhecimento em competência por meio da experiência prática. Quando, pela falta de continuidade, a aplicação do conhecimento não gera resultados, não há a formação de competências.”

Devo ressaltar que o artigo é dirigido aos jovens que se iniciam no árduo caminho do mercado de trabalho com o intuito de construir uma carreira. Tal público deve fazer uma leitura distinta da que pretendo aqui.

O meu intuito é falar sobre o papel dos docentes na preparação destes jovens e na sua própria para participarem da competição de mercado, pois vivemos sob a lógica de mercado, tanto em nossa dimensão profissional como na dimensão dos resultados que são esperados de nosso trabalho, ou seja, a preparação do jovem para seguir tal lógica.

Teremos nós contribuído para a incapacidade dos jovens em persistir? Teremos nós a consciência da relação resultados-competências proposta pelo autor?

O que mais me impressionou nestas afirmações foi a desconsideração do “potencial” em função dos “resultados”, pois em nossa prática, incentivados pelas reflexões teóricas, somos levados a priorizar o potencial e não os resultados, o que nos leva a não incentivar em nosso alunos a valorização da “formação” e da “persistência”. Bem como a fórmula, quase matemática, de conhecimento + experiência prática = competência, que reafirma a preponderância dos resultados na formação das competências. Isto está tão distante da prática docente atual. O que me leva a pensar que a escola está seguindo um caminho diametralmente oposto ao do contexto de mercado onde nossos jovens deverão integrar-se.

Daí, pergunto-lhes: por que mesmo passamos a desprezar a capacidade de atingir resultados no ambiente escolar como um todo e passamos a não cobrar de nossos alunos que os atingissem?

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Marcando o passo com um discurso vazio

Há uma crença bastante difundida de que os professores não se constituem como classe. Quem já não ouviu, ou se viu reproduzindo esta afirmativa: “Os professores são uma classe desunida!” Como todo discurso, esta afirmação revela muito do sujeito que o emite e do contexto em que ele é aceito. Primeiro: o que gostaríamos de entender como “classe unida”; e segundo: o que advém da repetição (sem reflexão) de tal afirmativa? Estas são questões que pretendem nos colocar, enquanto participantes desta “classe desunida” como co-responsáveis por este estado de coisas.

Para responder a primeira questão devemos entender que o modelo de classes vigente em nossa sociedade fundamenta-se na idéia de “luta de classes” que se evidencia na militância sindical. No entanto, entendo pessoalmente como classe a conjunção de ideais comuns por partes de pessoas que atuam num mesmo seguimento. Não há, de fato, esta conjunção de ideais. Cabe-nos, no entanto, questionarmo-nos o porquê. Apressadamente, diria que por ignorância do que vem ser seu ideal pessoal por parte de muitos dos professores. Entenda-se ideal como a plena consciência de seu papel e de suas funções e o anseio de bem desempenhá-los.

Ao reiterarmos a afirmação de que somos uma classe desunida simplesmente marcamos o passo, não avançarmos a lugar algum. Nem ao menos nos damos conta de que estamos contribuindo para a degradação da imagem social da profissão docente. E nesta sociedade só sobrevivemos a partir de uma boa imagem. Não estou dizendo que simplesmente abolindo esta afirmação de nossas falas algo vá melhorar, mas simplesmente que quando a afirmarmos devemos ter em mente o contexto que ela traduz, a saber, a depreciação do docente enquanto membro de uma classe e do poder de mobilização que este docente atuando enquanto classe tem.

Pense: Participar de uma classe não significa deixar-se tragar pela homogeneização, nem esconder-se atrás das ações do grupo, pelo contrário, ao atuar profissionalmente de maneira independente e ao afirmar-se em sua singularidade mais você estará contribuindo para a melhoria da imagem docente.

Recomendo: Um livro bastante agradável de ler: Uma história íntima da humanidade, de Theodore Zeldin. Ele trata da evolução histórica dos sentimentos humanos de uma maneira encantadora, sempre partindo de um relato de vida de uma pessoa comum. E um texto transformador: Tratado da correção do intelecto, de Espinosa. É começo de um pensar por si mesmo, sem se deixar levar por crenças irrefletidas ou pelo discurso persuasivo do outro. Ensina a tomar as rédeas de seu próprio pensar.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Profissionalizar-se: tornar-se professor

O envolvimento com a educação nasce de uma imposição, pouco a pouco vai tornando-se oportunidade, até fazer parte inalienável de nossa identidade. Este é o caminho por que muitos de nós, cidadãos escolarizados, passamos. Alguns chegam a se identificar tanto com a educação que passam a fazer parte efetiva de seu processo, profissionalizam-se: tornam-se professor.

Identifico o termo “profissionalização” com “tornar-se professor” justamente para realçar a dimensão profissional do ser professor dentro de uma lógica de mercado à qual não podemos escapar. O termo profissionalização demanda uma série de características que priorizam a qualificação do sujeito de tal forma que só pode resultar numa melhoria na qualidade de ensino.

As palavras têm força. Elas carregam em si certo poder de assujeitamento, vide a imagem profissional evocada em qualquer um (sem intenção preconceituosa explícita e pessoal) de expressões como “professor eventual”, “OFA”, “Categoria F” e outras. Por mais que queiramos ver o professor de outra forma tais palavras designam uma posição, um valor, um conceito do profissional que é colocado sob qualquer um destes rótulos, que revelam a degradação profissional da docência.

Pense: “Que imagens, sentimentos e ideias evocam certas palavras muito usadas no meio educacional? E como você se posiciona frente a elas e as ideias por elas evocadas?”

Recomendo: Dois textos, um do António Nóvoa, O regresso dos professores, e outro do Phillippe Perrenoud, Os dez não-ditos ou a face escondida da profissão docente. Ambos são encontrados facilmente na Net. Já li o texto de Nóvoa, não diz muita novidade, mas vale pelo enunciador do discurso. Estou para ler o texto de Perrenoud, o título me instigou, espero que me revele tal face escondida.